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Os trocadilhos nas paredes deixam duas coisas claras: que o ambiente e o serviço serão sempre sem peneiras e que o porco está por toda a parte — come-se “de tudo um porco” e, se há sítios que são croqueterias, este é uma “porcaria”.
O Pigmeu (1 Sol Guia Repsol 2025) nasceu para ser uma casa de sandes em Campo de Ourique, em Lisboa, focada num produto: o porco.
Mais de dez anos depois, só há uma sandes no menu (uma bifana em esteroides), mas a paixão pelo porco tornou-se uma questão política: aqui quer-se convencer o cliente a comer menos carne, mais vegetais e muitas miudezas.
A tal sandes tornou-se um ícone através das redes sociais do restaurante. Um pão de batata, assente num laguinho de molho de carne e com fatias finas de porco, “é pornografia alimentar”, diz Miguel Peres, o fundador da casa. A bifana a que chamou porcalhona ganhou eco nas redes sociais e é por lá (sobretudo pelo Instagram) que Miguel e a equipa vão, a pouco e pouco (ou a pouco e porco?), evangelizando.
A tarefa cumpre-se pela utilização dos animais de ponta a ponta — o uso tradicional do porco em tantas culturas — e pela redução do consumo de carne, trocando a quantidade por qualidade. É, para Miguel Peres, uma questão de reduzir o impacto ambiental e uma questão ética, de honrar a morte de um animal.
O menu é a materialização das ideias: o primeiro terço é dedicado a pratos de vegetais, o segundo, a pratos com miudezas e, por fim, apenas uma linha para os cortes de carne habitualmente grelhados. No Pigmeu desmancham-se porcos inteiros e só chega um novo animal quando o anterior foi inteiramente consumido.
É preciso perguntar qual o corte que neste momento está a ser servido — o lombinho, o cachaço ou os secretos que comumente se associam ao porco em restaurantes não estão sequer nomeados na carta. Com este propósito expresso à mesa, Miguel Peres quer mostrar que um restaurante gastronómico também pode produzir uma refeição equilibrada — tanto do ponto de vista nutricional como ambiental.
Para esta equação dar conta certa no final, é preciso trocar isto por miúdos. “Ficámos associados às miudezas, o sítio onde vais comer coisas estranhas”, diz Miguel Peres sobre uma época em que começou a servi-las mais assertivamente. Vinham à mesa os ovos com mioleira ou o pica-pau de túbaros, apresentado ainda hoje como pica-pau de tubarão.
“Temos tido o cuidado de tornar as miudezas mais fáceis, não queremos ser aquele sítio onde só o gourmand vem comer. Temos conseguido fazer coisas mais delicadas, as miudezas não podem ser uma parte ultragastronómica do menu, mas sim coisas que toda a gente vai querer comer.”
Os pastéis de massa tenra são um bom exemplo: o recheio é de coração temperado com chouriço, “são um dos favoritos”. “A nossa ideia é fazer algo tão bom e bem feito que não interessa se tem miudezas”, diz Miguel Peres. As palavras têm boas intenções, mas a realidade é que na hora de pedir, há poucos dispostos a arriscar nos fígados, nos rins, nos pézinhos ou na cabeça.
Para saltar as barreiras mentais, omitem o coração, chamam-lhes simplesmente pastéis de massa tenra de porco e, diz Miguel, nunca ninguém se queixou. Afinal, “é porco ou não é porco?”, pergunta. “Não podes fazer isto com tudo, claro. Mas os nomes ajudam. A nossa ideia é tornar as miudezas mais comerciais. Parece mal dito assim, mas é isso: queremos vender mais miudezas, pôr mais miudezas na mesa.”
Outra técnica para dar um rebranding aos miúdos é juntá-los a um rapaz popular. O mais recente exemplo é o prato de couve grelhada com caldo de pézinhos e berbigão, o cool kid. Sem nenhuma carne e apenas com o caldo dos pés de porco e um golpe de acidez, este prato tem tanto de inesperado como de familiar.
“Sente-se que aquilo é uma comida portuguesa, mas não é nada que conheças” — e é por este caminho que Miguel Peres e Alexandre Ballarin, cozinheiro, querem levar o porco no Pigmeu.
À primeira vista, parece uma contradição que Miguel Peres diga que o Pigmeu é “português, mas não tradicional”. Explica que o que há de português no Pigmeu “é o produto, os produtores, a estação” e umas quantas ideias que constituem uma espécie de catálogo gastronómico coletivo. O facto de Alexandre Ballarin ser brasileiro só ajuda a aceder à pesquisa nesse grande catálogo.
“Coisas que são muito óbvias para nós, para ele são extraordinárias: a patanisca, o molho de leitão como tempero, a chanfana, que no fundo é um estufado de vinho tinto e se pode fazer com cabeça de porco, como se faz na Bairrada. São as nossas bases e podem aplicar-se a muita coisa.”
O conhecimento da cozinha portuguesa é outra política no Pigmeu. Em 2023, a equipa fez várias viagens pela região da Bairrada para investigar receitas e as ligações culturais e gastronómicas à volta do porco. No final, a pesquisa deu uma série de vídeos no Youtube e um menu com feijoca e sarrabulho frito, arroz de leves (os pulmões) ou chanfana de cabeça.
Assim que houver um patrocínio, Miguel Peres quer alargar a pesquisa e os vídeos nas redes a outras regiões do país. O objetivo é mapear receitas e registar a relação familiar e umbilical com o porco, indo além dos pratos já bem conhecidos da Cozinha Tradicional Portuguesa, de Maria de Lourdes Modesto. De volta ao restaurante, promete verter tudo em novos pratos portugueses e ativistas.
Pigmeu. Rua 4 de Infantaria 68, Lisboa. De segunda a sábado, das 12h30 às 15h e das 18h30 às 22h30. Telefone: 218 252 990
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