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O chef João Oliveira nasceu a mais de 500km do Algarve, na pequena vila de Campo, em Valongo. Pescava no rio, construía brinquedos com os irmãos, tratava dos animais e sonhava ser veterinário. Passava muito tempo na casa dos avós, numa época em que “as raízes eram diferentes”.
Quando a sua avó adoeceu, aprendeu a cuidar dela, fazendo-lhe medições de glicose e percebendo o que podia ou não comer: “A minha mãe começou a deixar-me uma panela com água ao lume, no fogão a lenha e pedia-me para acrescentar cenoura, carne e arroz. Na inocência de pequenas tarefas, fui descobrindo o poder da gastronomia”.
Da memória original, em casa dos avós, a todas as outras que guarda até hoje, João passou por várias cozinhas, com destaque para as que partilhou ao lado do chef Ricardo Costa onde “a exigência, a consistência, as expectativas, as desilusões, as quedas” foram muito importantes.
A sua inquietação e sede de conhecimento, levaram-no à grande mudança para o Algarve. Primeiro, para o Vila Joya e, depois, em 2015, para o Vista (2 Sóis Guia Repsol), o restaurante do Bela Vista Hotel & Spa, junto à praia da Rocha, em Portimão.
Aberto desde 1934, este hotel de charme ocupa um lugar privilegiado no topo da falésia. Com todas as comodidades de uma hotelaria de excelência, a gastronomia foi colocada no centro da identidade do projeto: “Começámos do zero e os primeiros tempos foram de teste”.
Um ano depois da chegada de João Oliveira, o restaurante deixou de servir carne, glúten, à exceção do pão, e lactose, assumindo um conceito totalmente dedicado ao mar e à região: “Pela nossa localização, não nos fazia sentido estar a valorizar um produto como a carne, que não nos representa. Até por uma questão de sustentabilidade”, relativamente ao glúten e à lactose, a decisão aconteceu quando, por motivos de saúde, teve de adaptar a sua alimentação. Naturalmente a sua nova realidade refletiu-se na cozinha do seu restaurante.
Com o tempo, o chef fortaleceu ligações e encontrou novas parcerias na região, como a Quinta das Castelhanas, no Alvor, que passou a fornecer vegetais biológicos ao restaurante: “Não queria acreditar que tinha estado quatro anos da minha vida sem saber da existência de um projeto como este. A dona Quitéria e o filho plantam o que querem, quando querem e nós chegamos com uma caixinha e servimo-nos”.
Esta descoberta redefiniu o conceito: todos os pratos passaram a ter como base uma proteína vegetal ou marinha, da qual é feita uma gestão o mais integral possível: “Percebemos que os peixes e os vegetais funcionam da mesma maneira. Dentro do mesmo legume conseguimos ter sabores distintos, oferecendo dimensões diferentes do mesmo”.
O restaurante Vista passou, a partir daí, a assegurar um menu 95% produzido com produtos locais, os melhores da região, certificando-se da sustentabilidade dos mesmos: “A sustentabilidade em si, pode ser muitas coisas. Cada um tem a sua maneira de pensar e agir e a nossa foca-se no produto e no respeito que temos por cada ingrediente. Aproveitamo-lo ao máximo, testando todas as suas possibilidades e extraindo toda a sua riqueza. Para nós isto é o mais importante”.
A experiência no restaurante é também uma pequena viagem pelo hotel. Depois de começarmos no bar para um aperitivo e os primeiros snacks, seguimos para a cozinha, onde ficamos a conhecer a equipa e as respetivas estações. Há calma, organização e até aquela tensão anterior ao serviço, mas sobretudo há generosidade na partilha e a mensagem é clara: na equipa, todos contam.
Já na mesa, somos guiados por um mapa do Algarve dividido em três: Barlavento, Sotavento e Barrocal - a origem dos ingredientes protagonistas de cada prato. Descobrimos que dos barcos de pesca artesanal, que vemos através da janela, chegam as lulas utilizadas pelo chef numa reinterpretação das tradicionais lulinhas à algarvia.
No prato de tomate, compreendemos o processo de aproveitamento dos ingredientes e como, cada vez mais, o chef procura trazer para a mesa referências da cozinha tradicional algarvia. Tomates biológicos da época anterior foram secos e preservados, ganhando nova vida em forma de gel, água, granizado e concentrado. O pepino doce, os orégãos frescos e secos e as flores de camomila completam: “Fazemos uma salada algarvia e metemos no frigorífico cerca de cinco a sete dias. Esse caldo recorda-nos daquele momento em que temperamos a salada e passado uma hora, vamos lá com a colher provar”.
O senhor Casimiro, o único pescador de lagostim de grande calibre em Sagres, determina a disponibilidade de um dos pratos de assinatura do restaurante: o lagostim. Tivemos a sorte de provar a sua nova versão com couve-flor, comprovando, mais uma vez, o conceito: um prato, dois ingredientes e as suas mil possibilidades.
A couve-flor é apresentada em cuscuz, picles, creme, puré, gelatina e até a água da cozedura entra em cena. Do lagostim é servido o lombo. Tudo o que resta dos dois ingredientes é transformado em molho e é feito uma espécie de takoyaki, sem farinha ou amido. O toque final é dado com caviar, o único elemento em todo o menu, que foge ao localismo.
Ao longo da experiência, percebemos o papel importante da equipa da sala, que finaliza praticamente todos os pratos à mesa. Há simplicidade na partilha das ideias, dos produtos e do caminho de cada prato até chegar à nossa frente. A mensagem torna-se objetiva, traz cultura, tradição e, ao mesmo tempo, técnica e inovação.
O futuro do restaurante Vista promete uma imersão ainda mais profunda na gastronomia regional. A aproximação às comunidades, as idas à pesca “porque aprende-se sempre e há coisas que só os pescadores é que sabem” e os almoços e jantares intimistas do projeto CAL-DAY-RAH-DAH, com a artista portimonense, Inês Abrantes, têm ajudado na construção de um grande arquivo do receituário tradicional algarvio.
“O que é uma receita tradicional? De onde vêm? A ideia é responder a estas e tantas outras dúvidas que temos. Depois de construída esta biblioteca de tradições e conhecimento, vamos utilizá-la como inspiração e principal material de trabalho na cozinha”.
João Oliveira navega em mares alheios, distantes das suas raízes e isso relembra-nos aquela velha lição: “cuida bem do que não é teu”. No Vista, os sabores são genuínos, pensados com delicadeza e equilíbrio, valorizando a terra e o mar algarvio. A curiosidade do chef levá-lo-á ainda mais longe, mas, de onde estamos agora, a vista é memorável.
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